terça-feira, 20 de abril de 2010

SAC do Amor

E se o Amor fosse uma mercadoria, que estivesse à venda? Se pudéssemos adquirir através de um negócio, uma compra, como outra qualquer?

Em um dos meus (muitos) devaneios, fiquei imaginando como seria o diálogo entre um consumidor insatisfeito, e um funcionário do SAC :

- Bom dia, meu nome é Ana, falo com quem?
- Osvaldo, mas o dia não está bom, não.
- Em que posso ajudá-lo, senhor Osvaldo?
- Comprei um produto de vocês, o Amor, e não está funcionando.
- O senhor tem em mãos, a NF e o recibo de pagamento?
- Puxa, que saco, hein? Vou buscar.
...
- Tá, estão aqui.
- Poderia me passar os números, por favor, senhor?
- Tal, tal e tal.
- Um momento, por favor...só mais um minuto. Obrigada por aguardar, me diga qual o defeito que o produto apresenta.
- Simplesmente não funciona, minha filha! Comprei, segui as orientações do manual, ofereci à pessoa para a qual imaginei oferecer, e ela não aceitou.
- Sinto muito, senhor, mas o produto não tem garantia de aceitação.
- Como assim? Você tá de sacanagem comigo, não tá?
- Não, senhor. A mercadoria é para uso pessoal. Garantimos a sua satisfação, mas não que a pessoa para qual o senhor a dedique, retribua. Isso seria impossível.
- Mas isso não faz sentido, moça. Você acha que eu comprei esse negócio pra mim?
- Sim, senhor. O objetivo do Amor, é fazer bem a quem o sente, é proporcionar alegria a quem o utiliza. Não podemos nos responsabilizar que o efeito se dê nas demais pessoas, para as quais o senhor o estende.
- Deixa ver se entendi : eu devo ficar contente pelo simples fato de sentir Amor por alguém, mesmo que esse alguém não sinta por mim?
- E o senhor não fica?
- É claro que não! Que idéia sem pé nem cabeça! Desde quando, não ser correspondido, pode fazer alguém feliz?!
- Senhor, Amor é convite, não é intimação. É doação, não é troca. É liberdade, não é prisão.
- Quero devolver essa encrenca, entendeu? Não vou ficar com mais uma tranqueira em casa, que não serve pra nada!
- Tudo bem. Me passe os dados da sua conta bancária, que faremos o reembolso.
- Tá, e como eu faço pra devolver o produto?
- Devolva-o na loja onde o adquiriu, após confirmar o depósito em sua conta. Isso deve levar três dias úteis. Anote o número do protocolo, por favor.

Cinco dias depois, o Osvaldo foi à loja. No balcão, viu uma mulher, fazendo a mesma reclamação que ele fez por telefone:

- Você também ficou insatisfeita?
- Sim, eles fazem propaganda enganosa...não funciona, essa porcaria!
- Sei, eu estou devolvendo o meu. Segui as orientações, e quando ofereci, nada aconteceu.
- Deveríamos reclamar ao Procon.
- Também acho. Vamos até lá, juntos, já que nos sentimos lesados da mesma forma.
- Vamos, sim...duvido que resolva alguma coisa, mas...tudo bem.

Foram, fizeram a reclamação. Depois, tomaram um café, trocaram telefones. Ligaram. Saíram juntos, no domingo, com seus cachorros, pra passear no parque. Jantaram no restaurante preferido dele, depois de assistirem à estréia, no cinema, de um filme que ela queria ver.

Ficaram amigos, riem juntos. Ele acha incrível, o jeito delicado como aquela covinha que ela tem na bochecha se forma, quando ela sorri, e toma muito cuidado pra que ela não perceba que, às vezes, não consegue prestar atenção ao assunto sobre o qual ela está falando, porque fica hipnotizado pela sua beleza. Mas ele não diz nada disso, pra ela. Teme que se sinta pressionada a dizer alguma coisa legal, também, mesmo que não sinta, só para agradá-lo, e não quer correr esse risco.

Ela adora o cheiro dele. Não é o perfume que ele usa, que também é delicioso, mas o cheiro da pele dele, o cheiro natural. E o que dizer da voz? Nossa, ela contou para a melhor amiga, que a voz do Osvaldo é o som mais sensual que ela já ouviu. A amiga perguntou :

- Você já disse isso a ele?
- Ainda não. Por enquanto, me contento em saber e sentir.

Passou mais de um mês, desde que o Osvaldo ligou para o SAC.

Hoje, depois de já ter escutado de vários atendentes diferentes, que eles não podem passar a ligação para a Ana, e de continuar tentando, quase que a tarde inteira, aconteceu :

- Boa tarde, meu nome é Ana, falo com quem?
- Não deve ter só uma Ana, aí, mas eu reconheço a sua voz. Sou o Osvaldo, lembra de mim?
- Desculpe, senhor, mas, infelizmente...
- Não tem problema, Ana, eu lembro de você, e só queria dizer uma coisa.
- Pois não, senhor.
- “Amor é doação, não é troca”. Entendi o recado, muito obrigado.


Autor desconhecido

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